quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Racismo grosso, racismo chique

Há quem diga que é liberdade de imprensa. Este colunista acha que é racismo puro e simples. Basta tocar em qualquer tema que envolva pessoas de determinada crença, orientação sexual ou etnia, abrem-se as comportas do esgoto: insultos normalmente protegidos pelo anonimato contra negros, judeus, nordestinos, homossexuais, em espaços generosamente abertos por jornalistas ou veículos de informação que se consideram to-tal-men-te tolerantes. É até provável que não compartilhem do racismo, mas abrem seus espaços para os racistas e os protegem ao aceitar que façam comentários anônimos.
Em seu excelente blog sobre política internacional, o jornalista Gustavo Chacra adota uma posição clara – e rigorosamente correta – sobre os comentários às suas notas:
“Comentários islamofóbicos, antissemitas e antiárabes ou que coloquem um povo ou uma religião como superiores não serão publicados. Tampouco ataques entre leitores ou contra o blogueiro. Pessoas que insistirem em ataques pessoais não terão mais seus comentários publicados. Não é permitido postar vídeo. Todos os posts devem ter relação com algum dos temas acima. O blog está aberto a discussões educadas e com pontos de vista diferentes. Os comentários dos leitores não refletem a opinião do jornalista.”
As normas expostas por Gustavo Chacra abrem espaço para manifestação educada de quaisquer opiniões sobre os temas abordados. Não é preciso ser grosseiro ou insultuoso para que seus argumentos sejam vistos e levados em conta.
Os comentários são uma excelente oportunidade para que todos, e não apenas os detentores do espaço editorial, exponham suas opiniões. Não devem servir para que os intolerantes exponham seus preconceitos e sua falta de educação. Abrir espaço para incitação à intolerância não é servir à liberdade de imprensa: é tão grave quanto incitá-la pessoalmente.
E aí chegamos às páginas impressas, que há muitos anos tinham reduzido drasticamente as manifestações de racismo e intolerância em geral. Uma coluna, abordando opiniões de mulheres ricas sobre o mensalão, escorrega perigosamente, divulgando teses de algumas entrevistadas como a de que nordestinos devem ficar em seu estado natal, sem ousar morar em São Paulo. É curioso: o lendário Tavares de Miranda, por muitos anos dono da principal coluna social de São Paulo, era pernambucano. Um dos grandes repórteres de São Paulo, que acaba de ser merecidamente homenageado em seu 80º aniversário e continua em grande atividade, é o alagoano Audálio Dantas. Samuel Wainer, que sacudiu o jornalismo brasileiro com Última Hora e manteve por anos uma das principais colunas da Folha de S.Paulo, veio da Bessarábia, muito mais distante que o Nordeste. Um dos julgados no caso do mensalão, já com um voto pela condenação, saiu de São Paulo para envolver-se com problemas em Brasília. E se Barack Obama tivesse ficado lá nos fuuuuuuuuundos do Havaí, onde nasceu, evitando ir para Harvard, onde estudou, e para Illinois, onde se elegeu senador?
E, por favor, não vamos usar o argumento de que as pessoas falaram, e pronto. Jornalista não é gravador. E uma boa parte do que as pessoas falam não vai para o texto escrito – por ser redundante, por linguagem inadequada, por estar fora do foco da matéria. A intolerância tem de ser combatida, não divulgada. E, se os jornalistas não combaterem a intolerância, eles que tanto são vítimas dos intolerantes, quem é que o fará?


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